domingo, 24 de novembro de 2013

TOPOGRAFIAS DOS OLHAR - OSVALDO CARVALHO

Topografias do Olhar


Frente a um princípio científico estamos inexoravelmente imbuídos de um arcabouço teórico que compreende a realidade ou aquilo que univocamente entendemos como verdade. O olhar como método de estudo dos princípios necessários para a descrição e representação das superfícies é, diante daquela premissa, paradoxal, não possuindo os meios de quantificação, mensuração ou mesmo de exatidão da coisa em si, ainda que a perceba no seu todo. E é justamente aí que residem as artes visuais, no campo flutuante entre palpável e impalpável, analítico e abstrato, centrado e periférico, materializado e disperso, orgânico e inorgânico.

Nesse contexto cinco artistas de convívio intenso por um longo tempo vasculharam e evidenciaram em suas pesquisas artísticas as disparidades formais de suas criações que, contudo, no lugar de provocarem distanciamentos ou estranhamentos, criaram pontos de convergência que os uniram oportunamente. Cada qual, ao seu modo peculiar de encarar o embate frente o ato criador, estabeleceu parâmetros passíveis de desenvolvimento de um olhar topográfico sobre o mundo ao redor. Encontramos nas obras de Alexandre Alves o equilíbrio entre o tangível e o intangível em suas imagens capturadas de um instante. São como flutuações cromáticas de uma televisão sem sintonia, mas ao congelar o tempo em que elas se dão, ele tornou possível percebê-las em cada um de seus elementos constitutivos. Paulo Jorge Gonçalves tem como plataforma de investigação esmiuçar a simplicidade de determinados elementos num gesto contínuo e repetitivo, quase à exaustão, evidenciando uma energia pulsante em cada uma delas as quais trespassa e/ou funde abstrações num contraponto fervoroso que amplifica o gesto gráfico desse artista. Próximo a essas tratativas propostas por Paulo encontramos as propostas de trabalho de Gian Shimada que investe boa parte de suas reflexões nos descartes do próprio circuito de artes, momento que vincula sua produção ao caráter histórico que a arte possui ao mesmo tempo em que personaliza uma determinada linha crítica na qual atiça a brasa sobre questões de circuitos ideológicos cuja ação remonta aos anos da década de 70 do século passado. Marcelo Oliveira traz para o cenário imagético que constrói toda a dispersão possível do olhar cotidiano, aquele que se habitua à presença massiva da ordem que em dado momento o torna simplesmente invisível: são placas, letreiros, pichações, tudo junto num emaranhado informativo que se institui não mais por suas diretrizes convencionais, mas pela singularidade criada pelo acúmulo de ações aleatórias. João Moura, por seu turno, sustenta a necessidade de reportar topografias do corpo, do homem organicamente presente e ícone dos acontecimentos, também envolvido com o cotidiano, porém moldando alegorias contemporâneas, quase cruas em seu relato particular do mundo que vê.

Topografias do Olhar reúnem os relatos de artistas sensíveis ao seu tempo e abriga a diversidade de formas e conteúdos presentes nas suas obras, mas é antes de tudo um consenso de se permitir o convívio de diferentes maneiras de pensar e representar a vida.


Osvaldo Carvalho

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